ROCKY DENNIS

Não tenho grandes problemas com filmes de terror. Fui tranqüilo ver "O Exorcista" no cinema numa dessas comemorações da Warner em que eles relançaram os clássicos na telona, não tenho medo do "Poltergeist", embora não seja fã de deixar a estática da televisão rodando com aquele chiado. Aliás, quando a Globo reprisava o filme de madrugada e vinha aquela fala "Faremos agora uma pequena pausa em nossa programação...", confesso que não era tranqüilo que eu ia dormir. Mas mesmo assim, nada comparado a certos fóbicos que têm pesadelos com isso.

Mas lembro-me bem de uma vez em que fui correndo para minha mãe, literalmente. Eu estava vendo a novela "Que rei sou eu?" quando, num intervalo, passou a propaganda de um filme chamado "Face a face". Nunca descobri que raio de filme era esse, mas era sobre uma mulher muito deformada que queria fazer uma cirurgia para ficar normal. Só me lembro de ter ouvido a frase (dublada, evidentemente) "Há uma mulher bonita em mim". Levantei o rosto para olhar e fugi da sala.

Poucos anos depois, a Globo transmitiu o filme "Marcas do destino", com o Eric Stolz e a Cher. Meus irmãos, a princípio, não queriam ver, mas se acostumaram com a deformidade do tal Rocky Dennis e ficaram na sala. Eu resisti por muito tempo, mas acabei assistindo ao filme até o fim, quando ele morre de displasia craniofacial.

Naquela noite, nenhum de nós dormiu decentemente. Resolvemos dormir todos no mesmo quarto, com uma sensação de medo indefinível, não exatamente de pavor, mas algo que acabou se transformando em um grande desconforto durante a noite. Passei um ano tendo pesadelos recorrentes; no último deles, eu estava numa festa em que o tal Rocky Dennis iria chegar a qualquer momento e eu não conseguia ir embora.

O episódio mais bizarro envolvendo esse tipo de coisa aconteceu no dia de meu vestibular. Ao chegar no local da prova, vi um sujeito com uma deformação que parecia mal de talidomida, com as mãos nos ombros e sem braços. Usava uma pochete atravessada no corpo. Imaginei o que poderia ter causado isso a ele. Já durante a prova, reparei num candidato que usava duas pernas mecânicas e no lugar dos dedos das duas mãos, apenas dois dedos gordos que pareciam ter sido retirados dos pés e reimplantados.

Para coroar, no final, estava eu comendo um belo pão com ovo quando ouvi uma risada macabra, bem daquelas de filme de terror. Até hoje me lembro da cena em câmera lenta: virei-me para ver e encontrei um cara que simplesmente não tinha o lado direito do rosto, apenas uma massa disforme e um olho em algum lugar. Para disfarçar, jogava o cabelo comprido por cima.

Confesso que fiquei bastante perturbado e nem sei se disfarcei direito o horror que senti. Partindo para o politicamente correto, sei que não deveria sentir nada disso nem agir dessa forma, mas para mim era algo bastante traumático. Hoje, não tenho mais esse problema, mas certamente não voltaria a ver o filme que me aterrorizou na infância por livre e espontânea vontade.