VIVENDO NO RIO

Não é para imitar meu colega blogueiro Mariano, mas, como carioca, senti-me compelido a escrever esta crônica para aqueles que não compartilham de minha origem.

Ginga eu não tenho, não sou capoeirista nem nada. Samba no pé? Roqueiro como sou, seria impossível. Alem disso, sou alto e desengonçado, capaz de tropeçar no meu próprio pé tamanho 44 caso arrisque um passo. Mas ser carioca é mais do que isso.

Basta um passeio pelo Largo da Carioca, no Centro, para saber a quantidade de pessoas que vão querer te arrancar dinheiro com golpes "honestos": desde o cara que vende reforço para a sola do seu sapato que, após instalada não tem como ser tirada e você se vê obrigado a pagar o que ele exigir, até os engraxates que passam produtos "milagrosos" cujos preços só passam a ser conhecidos após sua utilização. Não podemos nos esquecer das barraquinhas de jogos na Uruguaiana ou na Sete de Setembro, nas quais o apostador sempre perde, mas continua jogando!

Por essas e outras que aprendemos a nos virar para não sermos enganados. Entramos no ônibus encarando todos os passageiros, identificamos assaltantes em potencial assim que entram e não temos vergonha de descer para evitar ser a próxima vítima. Atravessar uma rua, entrar numa loja ou banca de jornal são hábitos saudáveis de defesa.

O pior é que conseguimos fazer tudo isso com naturalidade, sem paranóia, sem medo de viver no Rio. Caso alguém tente negociar conosco, ficamos com os dois pés atrás, dificilmente nos deixamos ser enganados. É claro que ninguém é infalível, mas, na maioria das vezes, nos safamos bem.

Assim, quando deixamos nossa cidade, estamos preparados para quase tudo. Eu era bem criança quando estive na Espanha, mas me lembro bem de duas ciganas muito jovens, crianças ainda, que tentaram extorquir dinheiro do meu pai assim que chegamos na porta da pensão. No início, ele se fez de desentendido e esperou a multidão aglomerar. Quando todos estavam prestando atenção, virou-se para a mais velha e disse "¡No van a tener nada!". Furiosa, só lhe restou engolir seu orgulho e sair enquanto os pedestres riam de sua cara.

Nunca fui assaltado e tenho certeza de que o evitei diversas vezes. Sou uma improbabilidade estatística, o que significa que minha sorte pode chegar ao fim algum dia. Mas, com certeza, não por minha falta ou distração. Porque viver no Rio é um exercício de sagacidade. E tu? É malandro de onde?